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200 da Independência | O clero no Brasil independente
Profa. Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva (PUC-Campinas)
Prof. Dr. Ítalo Domingos Santirocchi (UFMA)
No decorrer do século XIX, as aceleradas transformações ocasionadas pelo advento das experiências constitucionais no mundo ibero-americano impuseram combinações complexas entre a perda do domínio dos grandes sistemas religiosos e as reconfigurações da religião, por sociedades que continuaram reivindicando-a como condição para se pensarem como novos constructos nacionais. Foi então que os respectivos espaços e margens de ação do religioso e do secular foram redefinidos, modificando as relações dos indivíduos e das comunidades com as instituições religiosas e destas com a política, a sociedade e a cultura. Enquanto algumas destas transformações se revelaram comuns ao mundo católico da época, outras foram profundamente marcadas por particularidades nacionais e mesmo regionais.
É neste sentido que a presente discussão pretende situar a experiência brasileira, à luz das reconfigurações sofridas pelos vínculos entre religião e política no decorrer do século XIX. O que significa considerar a própria dinâmica do catolicismo oitocentista em resposta a dois fenômenos mais amplos e longevos, que circunscreveram a modelagem recíproca de ambas as esferas: no campo político, a construção dos Estado nacionais; no religioso, o triunfo da vertente ultramontana, em relação a outras alternativas para se pensar o catolicismo nas sociedades modernas.
Sob tal perspectiva, o debate põe em evidência as reconfigurações dos nexos entre Igreja católica e Estado imperial brasileiro, tomando-as como dimensão expressiva do amálgama entre continuidades e rupturas, que marcara a independência do Brasil e impusera a dinâmica peculiar da formação do novo Estado nacional. O que implica considerar os aspectos institucionais e normativos, assim como as práticas simbólicas e discursivas dos agentes religiosos, enquanto produtores da simultânea integração e diferenciação do político e do religioso, no Brasil do século XIX.
Desse modo, pretende-se situar algumas das principais tensões e disputas definidas nas fronteiras borradas entre estas duas esferas. Por um lado, trataremos da ação político-religiosa do episcopado brasileiro na independência e durante o Império, buscando compreender a consolidação do ultramontanismo na segunda metade do século XIX. Ao mesmo tempo, será enfatizada a herança regalista que predominou entre o clero político que ascendeu às principais instâncias de representação política no imediato pós-independência, reiterando um modelo de relacionamento entre Estado e Igreja católica que reconfigurava o regime do padroado em moldes constitucionais. Por fim, será enfatizada a disputa entre ultramontanos e Estado imperial pelo controle das consciências, sobretudo a partir dos episódios conhecidos como a “Questão Religiosa” (1872-1875). Disputa esta que se desdobrou na atuação ultramontana através da imprensa periódica, instrumento por meio do qual buscou-se moldar hábitos e comportamentos dos fiéis, nomear os supostos inimigos da Igreja em defesa de um projeto civilizacional cristão, bem como difundir a normatização estabelecida pela Santa Sé, para o mundo católico da época.
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A Fundação Biblioteca Nacional convida para um episódio da série “200 da Independência”: O clero no Brasil independente
Quinta-feira, 30 de junho, às 17h.
Por Ítalo Santirocchi (UFMA) e Ana Rosa Cloclet (PUC-Campinas)
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Ítalo Santirocchi
Ítalo Santirocchi é Professor Adjunto da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Professor permanente da Pós-graduação em História da UFMA, Pós-doutor no Programa de Pós-Graduação em História da UNIRIO, Pós-doutorado pelo Programa de Pós Graduação em História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e Doutor em História pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma-2010). Possui "Licenza" em História Moderna e Contemporânea pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma-2003). Obteve graduação em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (BH-2000). É Membro dos Grupos de Pesquisa: História, Religião e Cultura Material - REHCULT (PPGHIS-UFMA) e Ecclesia - Grupo de Estudos de História do Catolicismo (UNIRIO). Atualmente presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Oitocentos (SEO).
Ana Rosa Cloclet da Silva
Ana Rosa Cloclet da Silva é Docente da Faculdade de História da PUC-Campinas e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências da Religião, pela mesma Universidade, com projetos integrados à Linha de Pesquisa: Fenômeno Religioso: instituição e práticas discursivas. Doutora em História pela Universidade Estadual de Campinas (2000) e pós-doutora na mesma área pela USP (2007), com projeto integrado ao grupo temático: “Brasil: Formação do Estado e da Nação”, coordenado por Istvan Jancsó. Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Campinas (1993) e mestrado em História pela Universidade Estadual de Campinas (1996). Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil Império. Atualmente, desenvolve pesquisas na área de História das Religiões, com pesquisas focadas na articulação dos fenômenos religião e política no Brasil do século XIX. Integra a rede de pesquisadores vinculados ao Projeto Iberoamericano de História Conceitual, mais conhecido como Iberoconceptos, no âmbito do grupo “Religón y Política”, que analisa as trajetórias semânticas de alguns conceitos expressivos das mutações nos nexos entre religião e política para diferentes quadrantes latinoamericanos, bem como os vínculos entre estas trajetórias ao longo do século XIX. Sua dissertação de mestrado, desdobrada na tese de doutoramento, teve como tema o projeto nacional de José Bonifácio de Andrada e Silva, trazendo à tona a filiação de suas ideias ao reformismo ilustrado luso-brasileiro. Neste sentido, seus trabalhos desvendam a trajetória de um personagem, ao mesmo tempo moldada e modeladora da transição de um Império luso-brasileiro a um Império brasílico. É autora de diversos artigos publicados em Revistas nacionais e estrangeiras e dos livros:
- Inventando a Nação. Intelectuais Ilustrados e Estadistas Luso-Brasileiros na Crise do Antigo Regime Português: 1750-1822. 1. ed. São Paulo: HUCITEC, 2006. (Resultado de sua tese de Doutorado).
- Construção da Nação e Escravidão no pensamento de José Bonifácio: 1783-1823. 1. ed. Campinas: Editora da Unicamp/Centro de Memória, 1999. (Resultado do seu mestrado)
- SILVA, A. R. C.; STEFANO, Roberto (Org.). História das religiões em perspectiva: desafios conceituais, diálogos interdisciplinares e questões metodológicas. 1. ed. Curitiba: Prismas, 2018. v. 1. 389p .
- ____(orgs.). Catolicismos en perspectiva histórica: Argentina y Brasil en diálogo. Buenos Aires: Teseo: 2020.
- SILVA, A. R. C.; NICOLAZZI, Fernando (Org.) ; PEREIRA, M. (Org.) . Contribuições à História da Historiografia Luso-Brasileira. 1. ed. São Paulo: Hucitec, 2014. v. 1. 463p.
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