Civilização tropical em perigo: cinema, elite e classes médias na Belle époque carioca
A virada entre os séculos XIX e XX foi um momento crucial na vida política, econômica e social do Brasil. Sendo o período marcado por uma grande instabilidade e reviravoltas políticas muitas vezes sangrentas, assistiu-se à transição de uma sociedade escravocrata a uma sociedade de classes, com inúmeras contradições ampliadas pela vida política da nascente República. Além disso, a migração das massas libertas com o fim da escravidão somou-se aos movimentos imigratórios oriundos de diferentes países e regiões (Itália, Japão, Alemanha, Portugal, Europa Oriental, Oriente Médio etc.) e, com isso, houve um impacto considerável nas paisagens urbanas brasileiras, sobretudo no Rio de Janeiro e em São Paulo.
Optamos por começar o trabalho a partir do Rio de Janeiro pelo fato de esta cidade ser à época a Capital Federal e o principal polo produtor e exibidor cinematográfico no Brasil. Por sua vez, a continuidade do projeto ao abordar a cidade de São Paulo remete ao papel central na economia e no projeto de modernidade assumido por ela ao longo do século XX e também ao seu lugar como agregadora de diversas comunidades de imigrantes em diferentes momentos.
Ao se situar no meio deste processo, a chegada do cinematógrafo ao Brasil também foi marcada por uma série de contradições que pautavam o mundo dos espetáculos nas principais cidades e, em maior escala, da sociedade que então começava a se remodelar no período pós-escravidão. Inserindo-se nos espaços outrora ocupados pelo teatro – que se encontrava em um processo de decadência à época –, as projeções cinematográficas paulatinamente conquistaram seu lugar no espaço urbano
No caso do Rio de Janeiro, estas desempenharam um papel fundamental na reforma empreendida pelo prefeito Pereira Passos e na disseminação do ideal de modernidade junto ao público carioca. Em se tratando de São Paulo, foram importantes para a vida não apenas de seus cidadãos, como também dos imigrantes que ali chegavam, a partir da necessidade destes em se ambientar tanto ao novo país quanto à vida urbana e de usufruir de momentos de lazer.
Pedro Lapera é Doutor em Comunicação pelo PPGCOM-UFF, pesquisador da Fundação Biblioteca Nacional e docente do PPGCINE-UFF, onde desenvolve pesquisas sobre a história do cinema no Brasil.
Segue o link para o artigo que norteou a discussão do evento: https://www.scielo.br/j/mana/a/bDrXP5JM3G7BwJFHwtddCZb/?lang=pt