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As cores e as ideias das elites oitocentistas
Francisco Gê Acayaba Montezuma
Eram ainda os primeiros dias do verão de 1854. Mas é provável que o calor dos trópicos já estivesse a castigar as ruas da cidade do Rio.
Ainda assim, debaixo das sobrecasacas e dos seus calções aveludados, aqueles homens paramentados com as suas cartolas, bengalas com castão lustrado e botinas bem afiveladas se esforçavam para não deixar transparecer qualquer sinal de desconforto. Nas dependências do Paço, esperavam ansiosos para que o imperador oficializasse a graça anunciada.
Em meio ao seleto grupo de participantes, um sujeito “calvo”, de “estatura alta”, “pardo escuro” e “olhos vivos” ensaiava um pequeno discurso.[1] Aprumado, fazia-se atento aos melindres da etiqueta, típicos dos cerimoniais daquela natureza. Preparava-se, enfim, para receber, dentro de mais alguns instantes, o título que o consagraria para a posteridade.Homem livre. De pele escura. Chefe de uma família numerosa. Investidor e proprietário de homens e terras. Tudo conforme algumas dezenas de documentos atualmente mantidos sob a guarda do Arquivo Nacional, dentre os quais: apontamentos contidos nos livros de notas dos tabeliães cariocas; processos pinçados em meio às pilhas e mais pilhas que se acumulavam nos gabinetes dos tribunais locais; para além de certidões e outros papeis espalhados por diversas repartições do próprio governo imperial.
Tendo desfrutado do suporte oferecido pela pequena família composta por gente livre e, em alguma medida, metida com os
negócios da escravidão,[2] Francisco Montezuma, o visconde de Jequitinhonha (1794-1870), possuía diploma em Leis pela Universidade de Coimbra. Ainda no começo do século XIX, destacou-se como redator de alguns jornais de opinião surgidos na Bahia e no Rio de Janeiro. Aos poucos, o reconhecimento gerado por seu engajamento nas campanhas pela independência, já no começo da década de 1820, foi-lhe facilitando a conquista de posições de mando e prestígio, determinantes para o seu envolvimento no processo de montagem do edifício imperial.Aos olhos de muitos dos convidados presentes àquela pequena cerimônia ocorrida sob o sol forte de dezembro, Francisco Montezuma era alguém digno de figurar nas páginas das famosas galerias de homens “distintos e ilustres” daquele período.[3] Já para outros convivas, contudo, ele não passava de um “velhaco (...) catingoso” e “sem vergonha”: um “mestiço” convertido em “fidalgo”, mas com “raízes” fincadas lá “pela Guiné”.[4]
Mesmo quando dividia opiniões, Francisco Montezuma não estava sozinho. Apesar da força dos estigmas associados às memórias, tradições e condições familiares de cada um, hoje se sabe que, assim como ele, muitos membros da sua geração souberam se aproveitar da intimidade com as letras e das possibilidades de inserção em espaços como o da imprensa e o da maçonaria, por exemplo. Por esses caminhos, foram capazes de potencializar recursos e alianças em um contexto no qual a instrução passava a se tornar uma credencial quase tão valiosa quanto o berço.[5]Considerado por Montezuma como seu “amigo do coração”,[6] o conselheiro Antonio Pereira Rebouças (1798-1880) era um desses figurões. Advogado e baiano como ele, também possuía excelente trânsito nas altas esferas da sociedade oitocentista.[7]
Agraciados com condecorações e outros títulos pomposos concedidos pelo imperador, os dois conterrâneos possuíam histórias e feições bastante particulares, mas que sempre tiveram muito a dizer sobre o dinamismo, o papel, e mesmo os olhares lançados sobre o fenômeno das mestiçagens no Brasil do século XIX, e não apenas nele.[8]
Francisco Montezuma viveu muito. E, assim como Rebouças e outros tantos frequentadores da corte imperial, ele construiu sua carreira e sua imagem em um tempo no qual, segundo o experiente marquês de São Vicente, a política já ensinava: sobre as diferenças ditas de cor ou de raça, o mais
conveniente era, sempre, calar.[9]Montezuma sabia que o marquês tinha lá suas razões para se expressar dessa maneira. Afinal, embora deparar-se com homens dotados de tons e de traços os mais variados ocupando posições de poder representasse um fato muito mais comum do que ainda hoje se imagina,[10] naquele contexto algumas ideias se mantinham extremamente sedutoras. Dentre elas, a de que os sinais exteriores da ancestralidade africana eram indicadores de vícios e defeitos. Logo, que denotavam, entre outras coisas, uma pretensa falta de “qualidade”.[11]
Inscrita na própria legislação do período colonial, por muito tempo essa máxima acabou servindo de pretexto para a veiculação de zombarias e a imposição de toda a sorte de constrangimentos, quando não como obstáculo concreto ao exercício de certos direitos. É verdade que, na Constituição de 1824, primeira e única a vigorar ao longo de todo o período imperial, ela não chegou a ser incluída. Mas isso, no entanto, não significa que não tenha deixado seus rastros.[12]
Não por acaso, por anos a fio a opção por não se falar sobre as marcas do nascimento esteve no centro de uma série de discussões e mobilizações cotidianas.[13] Associada à busca insaciável por prestígio e, até, por um ou outro privilégio, geralmente resultava, para começo de conversa, do simples desejo de ser reconhecido como um igual pelos pares.[14]
Diante desse quadro, Francisco Montezuma foi dos que realizaram uma aposta consciente e bastante politizada na manutenção dessa espécie de acordo de cavalheiros, isto é: desse “pacto de silêncio” acerca de traços considerados capazes de apontar para raízes vistas como socialmente comprometedoras.[15]
Ao contrário de Rebouças, que, ao discutir o problema da igualdade de tratamento e de oportunidades entre os homens livres, e apenas entre eles, repetidamente insistiu em frisar que era “mulato”[16] e, no fim das contas, foi perdendo cada vez mais espaço no tabuleiro da política, entre altos e baixos Montezuma conseguiu manter-se, sempre, em evidência.
De forma geral, toda vez que chamado à discussão, o visconde também encampava o discurso da defesa dos direitos dos cidadãos brasileiros. Para isso, colocava-se, via de regra, como um paladino da ordem e da legalidade, bem ao modo de Antonio Rebouças e de outros tantos parlamentares e publicitas com os quais ambos estavam acostumados a conviver diariamente. Mas, enquanto ele próprio, Montezuma, adotava um viés marcadamente impessoal em suas intervenções, expressando-se somente segundo a letra fria da lei, Rebouças, por exemplo, preferia abordar o assunto fazendo um movimento arriscado: jogando com a própria imagem, explicam as historiadoras Hebe Mattos e Keila Grinberg, inclusive neste pequeno vídeo de divulgação histórica, ousava politizar a sua cor.[17]
Sem nunca se voltar para a sua árvore genealógica com o objetivo de reivindicar uma determinada forma de identificação, em nenhum momento Francisco Montezuma assumiu, publicamente, como sua, a causa encampada pelo seu conterrâneo. Aliás, não foram poucas as vezes em que ele argumentou, até, que todos os homens livres nascidos no país gozavam da “mais ilimitada igualdade” e da mesmíssima “consideração” perante as autoridades e as leis.[18]
Se Montezuma acreditava mesmo nisso, é difícil dizer. De qualquer maneira, não deixa de ser sugestivo o fato de ele ter deixado essas e outras pérolas
bastante semelhantes imortalizadas em alguns discursos e, até, em um livro de sua autoria. Contendo cerca de quatrocentas páginas, o exemplar começou a circular em 1834, justamente quando o assunto se encontrava na ordem do dia.[19] Publicado em formato miúdo, foi anunciado nos jornais da época da seguinte maneira:Partindo em defesa do regime vigente, Montezuma usou um capítulo inteiro desse seu livreto para contrapor as realidades do Brasil e dos Estados Unidos, especialmente pela chave do preconceito racial. Segundo ele, se, no país vizinho, o “homem branco” e o “homem de cor” não podiam viver “juntos e igualmente livres”, pelas bandas de cá não se fazia esse tipo de “distinção”: à exceção dos “escravos”, todos os brasileiros, independentemente da “raça”, gozavam “dos mesmos direitos” e eram efetivamente tratados como “cidadãos”.[20]
Apesar de apoiado e até repetido por um bocado de gente, desnecessário dizer que o argumento de Montezuma viu-se rotineiramente colocado à prova, em vários espaços e situações da vida cotidiana, bastando tomar como exemplos os casos recuperados por outros colaboradores deste portal, ou ainda aqueles reunidos em outros trabalhos igualmente instigantes.[21]
Ao mesmo tempo, durante os períodos em que ocupou as cadeiras de ministro da Justiça e dos Negócios Estrangeiros, em 1837, de Conselheiro de
Estado, entre as décadas de 1850 e 1870, e as de deputado e senador em diferentes fases da vida, o baiano deixou vários indicativos de que o problema da liberdade e dos direitos acessíveis às pessoas de origem africana ou, sobretudo, aos seus descendentes, constituiu uma parte fundamental do seu horizonte de preocupações.Ainda assim, ou talvez por isso, curiosamente o visconde mostrou-se um grande apoiador das práticas e dos discursos inspirados nos supostos “perigos” e “inconvenientes” da presença africana na sociedade brasileira. Mirando em problemas como o das alegadas ameaças à moralidade e aos “bons costumes”, e sempre explorando o “medo” constante das revoltas escravas, na maior parte das vezes ele fez questão de trabalhar de mãos dadas com a polícia.
Nesse sentido, sua excelência assinou decretos de proibição a um punhado de danças de rua que costumavam agitar as noites cariocas; empenhou-se em acabar com a prática dos libambos[22] na cidade; e não se fez de rogado ao questionar e, até mesmo, tentar interferir em esquemas de recepção, registro e distribuição de africanos escravizados trazidos, ilegalmente, ao Brasil.
Além de esmiuçarem todas essas problemáticas, vários documentos hoje custodiados pelo Arquivo Nacional ajudam a dar a medida do quanto
Montezuma e outras tantas autoridades imperiais se esforçaram para fazer valer suas convicções. Baixando ordens e elaborando pareceres destinados a impedir a entrada ou, conforme o caso, a permanência de negros estrangeiros no país, por exemplo, o baiano era dos que partiam da associação entre africanidade, escravidão e mal social para saírem em defesa de um projeto bastante específico de cidadania e nação: na sua perspectiva, ambas incontornavelmente mestiças; logo, uma necessariamente tutelada, e a outra necessariamente restritiva.[23]Logo após a morte de Montezuma, em fevereiro de 1870, ou, mais precisamente, apenas alguns meses depois da aprovação da lei do ventre livre, em setembro de 1871, o Brasil contava com uma parcela crescente de população composta por homens e mulheres de ascendência africana já distanciados da experiência do cativeiro.[24]
Pois justo nesse contexto, personalidades com marcada atuação nos espaços institucionais de poder começaram a investir, de maneira cada vez mais frequente e, também, mais incisiva, na ideia de que o país não conhecia o “desprezo pela raça africana”. Seguindo nessa toada, diziam que, historicamente, “o homem de cor” havia sempre se deparado com “todas as avenidas abertas diante de si”. Se dotado de “caráter”, “talento” e “mérito”, não haveria obstáculo capaz de impedir o seu acesso a posições de destaque e prestígio na sociedade brasileira.[25]
É bem verdade que, pelo menos ao que tudo indica, as origens de Montezuma jamais foram suficientes para fazê-lo se deparar com restrições ao gozo e ao exercício de direitos consagrados na letra da lei. Mas, apesar de socialmente bem posicionado, desde muito cedo ele próprio percebeu que, sobretudo em momentos de ameaça à estabilidade do regime escravista e à sobrevivência de concepções tradicionais de hierarquia e pertencimento, nem mesmo barões, marqueses e viscondes eram poupados, tanto na tribuna quanto, principalmente, nas páginas da imprensa.
Acontece que, mesmo adotando uma postura distinta de alguns velhos conhecidos como Antonio Rebouças, ao longo dos seus mais de quarenta anos de atuação na esfera pública Francisco Montezuma também não conseguiu manter-se imune a provocações e comentários depreciativos veiculados em panfletos e periódicos. Através deles, seus adversários dirigiram-lhe acusações e impropérios baseados em indícios, supostamente, recolhidos em sua genealogia, e que, de alguma maneira, o vinculavam ao universo da escravidão.
Mobilizada enquanto forma de apreender e justificar desigualdades, pelo século XIX adentro a moderna noção de raça ensejou a construção de estereótipos e balizou a formulação de projetos políticos excludentes. Inegavelmente, foi utilizada para orientar diversas tentativas de preservação de práticas e de códigos hierárquicos fundados na vinculação entre africanidade e memória do cativeiro.[26]
Ao mesmo tempo, e tal como testemunhado pelos próprios filhos e netos do visconde de Jequitinhonha e, também, do conselheiro Antonio Pereira Rebouças, nesse período o argumento racial também passou a ser bastante utilizado como instrumento de afirmação e luta por direitos. Nesse sentido, diferente daquilo que tentavam fazer crer certas figuras de destaque no cenário político de então, atores sociais confrontados com o pretenso estigma da ancestralidade africana iam passando a se mobilizar de forma cada vez mais veemente e organizada. Indo a público para denunciar, em primeira pessoa, a desigualdade de oportunidades e os frequentes constrangimentos ao exercício de direitos fundamentais, essa mocidade especialmente engajada nos espaços dos jornais, das conferências públicas, dos clubes e das associações de curta duração fazia lembrar os problemas antes vocalizados por vultos como Antonio Rebouças. Problemas observados, bem de perto, inclusive, por Francisco Montezuma, muito embora retoricamente negados por ele. E isto, provavelmente, por razões que não só a política recomendava, mas, também, que o seu próprio tempo, ainda hoje, talvez explique.
Sebastião de Castro Junior
Doutor em História Social (Unicamp)
Referências
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[1] SUETÔNIO. O Antigo Regime. Homens e coisas. Prefácio de Quintino Bocaiúva. Rio de Janeiro: Cunha; Irmão, 1896, p. 8.
[2] Documentos capazes de revelar indícios mais concretos acerca da família de Francisco Montezuma ainda são bastante raros. Aqueles a que tive acesso dão conta de que sua mãe ostentava o título de dona. Já o pai, aparentemente, tocava seus negócios a partir das rotas atlânticas que ligavam o litoral da Bahia à costa ocidental do continente africano. Cf. Cópia de Sentença de Justificação de Batismo de Francisco Gomes Brandão. Bahia, 28 de junho. Arquivo e Museu de Arte da Universidade de Coimbra, apud: BULCÃO SOBRINHO, Antônio de Araújo de Aragão. “Titulares Baianos”. In: Revista do Instituto Genealógico da Bahia. Bahia: Instituto Genealógico, 1946, p.131-132; e Diário do Rio de Janeiro, nº. 24, 23 de outubro de 1834.
[3] A expressão entre aspas foi extraída da Introdução dessas mesmas galerias, provavelmente uma das mais emblemáticas editadas no curso do século XIX. Trata-se da Galeria dos brasileiros ilustres (os contemporâneos), retratos dos homens mais ilustres do Brasil, na política, ciências e letras, desde a guerra da independência até os nossos dias. Rio de Janeiro: Lithographia de Sébastien Auguste Sisson, 1861. Além de reeditada pelo Senado Federal em 1999, e disponível em https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/1027 , a obra também pode ser consultada no portal Brasiliana da Universidade de São Paulo, através deste link: https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/1/simple-search?query=&sort_by=score&order=desc&rpp=10&filter_field_1=author&filter_type_1=equals&filter_value_1=Sisson%2C+Sebastien+Auguste%2C+1824-1898&etal=0&filtername=subject&filterquery=BRASILEIROS&filtertype=equals .
[4] ANÔNIMO. A Ressurreição de Jequitinhonha. Rio de Janeiro: Tip. e Lit. do Ba-ta-clan, 1865.
[5] Cf. GRINBERG, Keila. O fiador dos brasileiros: direito civil, escravidão e cidadania no tempo de Antônio Pereira Rebouças. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 71; MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Bahia, século XIX: uma província no Império. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992, p. 291.
[6] Francisco Montezuma a Antonio Pereira Rebouças. Rio de Janeiro, 14 de março de 1842. Biblioteca Nacional, Manuscritos, I-3, 23, 39.
[7] A trajetória do conselheiro Rebouças foi estudada, em profundidade, pela historiadora Keila Grinberg no livro O fiador dos brasileiros...
[8] Sobre os contornos, os desdobramentos e as conotações das dinâmicas das mestiçagens no Brasil escravista, ver, entre outros trabalhos, aqueles reunidos nas seguintes coletâneas: IVO, Isnara Pereira; PAIVA, Eduardo França (org.). Dinâmicas de mestiçagens no mundo moderno: sociedades, culturas e trabalho. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2016; PAIVA, Eduardo França; AMANTINO, Márcia; IVO, Isnara Pereira (org.). Escravidão, mestiçagens, ambientes, paisagens e espaços. São Paulo: Annablume, 2011; PAIVA, Eduardo França; IVO, Isnara Pereira e MARTINS, Ilton Cesar (org.) Escravidão, mestiçagens, populações e identidades culturais. São Paulo: Annablume, 2010; PAIVA, Eduardo França; IVO, Isnara Pereira (org.). Escravidão, Mestiçagem e Histórias Comparadas. São Paulo: Annablume, 2008.
[9] Aqui, faço referência a um voto proferido por José Antonio Pimenta Bueno (1803-1878) durante a apreciação de uma questão judicial levada ao Conselho de Estado. Por ocasião do exame dos estatutos de uma sociedade beneficente composta por africanos libertos e seus descendentes diretos, o marquês manifestou-se contra a exaltação das diferenças de cor e de origem entre os habitantes do Império. Considerou que seria absolutamente impróprio o ato de referendar o funcionamento de uma associação voltada, apenas, às pessoas “de cor preta”. Em suas palavras, a petição da Sociedade Beneficente da Nação Conga não era digna, sequer, de ser conhecida pelo imperador. Até porque, sobre a “distinção ou divisão por castas”, a “política” já “ensina[va] antes a regra de não falar-se” a respeito. Cf. Pareceres do Conselho de Estado, caixa 531, pacote 3, documento 46: Sociedade Beneficente da Nação Conga; parecer sobre estatutos (7 de maio de 1862) – Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, apud: CHALHOUB, Sidney. “Solidariedade e liberdade: sociedades beneficentes de negros e negras no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX”, in: GOMES, Flavio dos Santos; CUNHA, Olívia Maria Gomes da (org.). Quase-cidadão: histórias e antropologias do pós-emancipação no Brasil. Rio de Janeiro: Fgv, 2007, p. 219-239.
[10] Cf. RUSSELL-WOOD, A. J. R. “Autoridades Ambivalentes: o Estado do Brasil e a contribuição africana para ‘a boa ordem na República’”. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da (org.). Brasil – Colonização e escravidão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000, p. 105-119.
[11] A respeito do tema, ver, por exemplo, VIANA, Larissa. O idioma da mestiçagem: as irmandades de pardos na América Portuguesa. Campinas: Editora da Unicamp, 2007; RAMINELLI, Ronald. Nobrezas no Novo Mundo. Rio de Janeiro: Fgv, 2015.
[12] Além de garantir a continuidade das relações escravistas, a Constituição de 1824 estabeleceu limites à participação na vida pública com base nos critérios de propriedade e nascimento. Neste sentido, os cidadãos brasileiros foram formalmente divididos em três diferentes “gradações”. Primeiro, o cidadão passivo, isto é, aquele sem renda suficiente para ter direito a voto. Logo na sequência vinham o cidadão ativo votante, em referência àquele com renda suficiente para escolher o colégio de eleitores, e, por fim, o cidadão ativo eleitor e elegível. No entanto, neste terceiro nível, uma distinção fundamental e de caráter não propriamente censitário se impunha. Era ela: a de que, além das exigências anteriores relacionadas à renda, todo aquele que desejasse se candidatar a um cargo eletivo precisava ter nascido livre. Cf: Constituição Política do Império do Brasil..., Título 4º., Capítulo VI (disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm); e MATTOS, Hebe. Escravidão e cidadania no Brasil monárquico. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2000, p. 21.
[13] Algumas dessas manifestações, assim como seus ecos e efeitos na cena pública imperial, foram identificadas e analisadas por LIMA, Ivana Stolze. “Com a palavra, a cidade mestiça. Imprensa, política e identidade no Rio de Janeiro, 1831-1833”. In: MATTOS, Ilmar Rohloff de (org.). Ler e escrever para contar: documentação, historiografia e formação do historiador. Rio de Janeiro: Access, 1998, p. 161-184; PANDOLFI, Fernanda Cláudia. “Discriminação Racial e Cidadania no Brasil do século XIX (1829-1833)”. In: Revista de História, nº. 179, p. 1-37, 2020; DANTAS, Mônica Duarte (org.). Revoltas, motins, revoluções: homens livres pobres e libertos no Brasil do século XIX. São Paulo: Editora Alameda, 2011; LOPES, Juliana Serzedello. Identidades políticas e raciais na Sabinada (Bahia, 1837-1838). São Paulo: Alameda, 2013; HARRIS, Mark. Rebelião na Amazônia: Cabanagem, raça e cultura popular no Norte do Brasil, 1798-1840. Campinas: Editora da Unicamp, 2017; BASILE, Marcello. A politização das ruas: projetos de Brasil e ação política nos tempos de Regências, vols. 1 e 2. Brasília: Senado Federal, 2022.
[14] Em essência, este argumento foi desenvolvido pela historiadora Hebe Mattos em Das cores do silêncio: os significados da liberdade no sudeste escravista – Brasil, século XIX (3ª. ed.). Campinas: Editora da UNICAMP, 2013.
[15] Idem.
[16] Nesse sentido, veja-se, por exemplo, os Anais do Parlamento Brasileiro - Câmara dos Srs. Deputados..., sessão em 13 de maio de 1843, disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=132489&pagfis=17876 . Foi nesta oportunidade que o conselheiro Rebouças pronunciou um dos seus discursos mais emblemáticos na Câmara dos Deputados. Imediatamente, sua fala alcançou enorme repercussão na cena pública dos anos 1840. Para maiores detalhes, ver GRINBERG, Keila. O fiador dos brasileiros..., capítulos IV e V.
[17] MATTOS, Hebe; GRINBERG, Keila. “Antonio Pereira Rebouças e a cidadania sem cor”. In: Insight | Inteligência, vol. VI, nº. 20, p. 90-96, 2003.
[18] MONTEZUMA, Francisco Gê Acayaba. A liberdade das repúblicas. Rio de Janeiro: Tipografia do Diário de N. L. Vianna, 1834, p. 365.
[19] Veja-se, entre outros, LIMA, Ivana Stolze. Cores, marcas e falas: sentidos da mestiçagem no Império do Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003; PINTO, Ana Flávia Magalhães. Imprensa negra no Brasil do século XIX. São Paulo: Selo Negro, 2010; AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Maçonaria, Antirracismo e Cidadania – uma história de lutas e debates transnacionais. São Paulo: Annablume, 2010; e BASILE, Marcello. Ezequiel Corrêa dos Santos: um Jacobino na Corte Imperial. Rio de Janeiro, Editora Fgv, 2001.
[20] MONTEZUMA, Francisco. A liberdade das repúblicas..., p. 364-367, destaque no original.
[21] Apenas a título de exemplo, vale citar os trabalhos referenciais de
CHALHOUB, Sidney. A força da escravidão: ilegalidade e costume no Brasil oitocentista. São Paulo: Companhia das Letras, 2012; MAMIGONIAN, Beatriz Gallotti. Africanos livres: a abolição do tráfico de escravos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2017; e ALBUQUERQUE, Wlamyra. O jogo da dissimulação: abolição e cidadania negra no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
[22] Como esclarece o historiador Alberto da Costa e Silva no Prefácio a uma de suas obras mais conhecidas, por libambo se entendia “... a cadeia de ferro com que se jungia uma fila de escravos pelo pescoço”. No entanto, “não era raro que o colar e a corrente de metal fossem substituídos por meios mais antigos e mais baratos, e em muitas caravanas de cativos o que se via eram a corda, a tira de couro e a forquilha. Punha-se nesta, de frente, o pescoço de um aflito e se fechava a bifurcação com um pedaço de pau muito bem amarrado. Num outro infeliz, a forqueta ia apoiar-se na nuca, fechando-se depois na goela. Amarravam-se os cabos das forquilhas, de modo que os dois escravos não podiam separar-se, e cada dupla era ligada a duas outras por cordas que lhes amarravam as mãos”. Cf. SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo: a África e a escravidão, de 1500 a 1700 (2ª. edição). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011, p. 17.
[23] Na década de 1860, apesar de já se achar bastante debilitado, Francisco Montezuma ainda demonstrava ter disposição de sobra para acompanhar as discussões relacionadas aos destinos da escravidão. Já pelo final da vida, ou quase quinze anos depois daquela solenidade por meio da qual ele veio a alcançar o seu cobiçado título de nobreza, o baiano apresentou ao Senado projetos de abolição gradual da escravidão no Brasil. Entretanto, ao mesmo tempo defendeu restrições aos direitos políticos dos filhos e filhas de mães escravizadas que viessem a nascer após a então chamada lei do ventre livre.
[24] Essa percepção de apoia nos dados reunidos no recenseamento geral realizado em 1872 (cf. Lei nº. 2040 de 28 de setembro de 1871, sobre o estado servil e decretos regulando a sua execução. São Paulo: Typ. Americana, 1872; e SENRA, Nelson de Castro. História das estatísticas brasileiras. Rio de Janeiro: IBGE, 2006, vol. 1, p. 418-9; 423), mas cujos resultados só se tornaram conhecidos ao longo dos anos de 1876 e 1877. Para um breve balanço analítico dessa iniciativa, ver CHALHOUB, Sidney. “População e Sociedade”. In: CARVALHO, José Murilo de (org.). A Construção Nacional, 1830-1889 (Coleção História do Brasil Nação, 1808-2010 - vol. 2, direção de Lilia Moritz Schwarcz). Rio de Janeiro: Objetiva, 2012, p. 59-68.
[25] Joaquim Nabuco. O abolicionismo. São Paulo: Ed. Nacional, 1938 [1883], p. 22-23.
[26] A esse respeito, ver, por exemplo: SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil (1870-1930). São Paulo: Companhia das Letras, 1993; e MATTOS, Hebe. Marcas da escravidão: biografia, racialização e memória do cativeiro na História do Brasil. Tese apresentada em concurso para Professor Titular em História do Brasil. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2004.
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4. O Sr. Antonio Pereira Rebouças - O Novo Mundo, nº 53, 22 de fevereiro de 1875. (Hemeroteca Digital Brasileira / Fundação Biblioteca Nacional)
5. Arquivo Nacional. Fundo Polícia da Corte - BR_RJANRIO_0E_COD_0324_v_02 (p.84).
6. Diário do Rio de Janeiro, nº 26, 30 de abril de 1834, p. 2. (Hemeroteca Digital Brasileira / Fundação Biblioteca Nacional)
7. Arquivo Nacional. Fundo Série Justiça - Polícia - Escravos - Moeda Falsa - Africanos (IJ6) - BR_RJANRIO_AM_IJ6_0174
8. Arquivo Nacional. Fundo Conselho de Estado - BR_RJANRIO_1R_COD_0306_v_35