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Arquivo Nacional lança Projeto “Cartas de Arquivo”
Como parte das comemorações de seus 180 anos, o Arquivo Nacional está lançando o projeto “Cartas de Arquivo”, em parceria com a Definitiva Cia de Teatro e a Via 78. Uma vez por mês, será realizada a leitura dramatizada de uma carta, visando difundir parte de seu acervo textual, o maior do Brasil.
Nesta primeira edição, apresentamos a carta de despedida do conde d'Eu aos brasileiros, a bordo do cruzador “Parnaíba”, no ancoradouro de Ilha Grande, em 17 de novembro de 1889.
Veja a leitura dramatizada dessa carta no YouTube do Arquivo Nacional: https://youtu.be/RNp1DFVZY7Q
O documento faz parte do acervo Família Vieira Tosta, ainda em fase de tratamento técnico. Quando finalizado, será disponibilizado para consulta - BR RJANRIO RI, CX2, PT2/1.
Nas primeiras horas do dia 17 de novembro de 1889, o ex-imperador d. Pedro II e sua família – a imperatriz Tereza Cristina, seu neto Pedro de Alcântara, a princesa Isabel, seu marido conde d'Eu e filhos – embarcavam no cruzador “Parnaíba”, rumo ao exílio na Europa.
Escoltado por militares, furtivo aos olhares da população para evitar quaisquer manifestações, a família imperial era banida do Brasil pelo governo provisório que se instalara após 15 de novembro.
Para a recém-proclamada República, a figura do imperador, mesmo desgastada pelas sucessivas crises que passara a já finda monarquia, parecia ser um empecilho para consolidação do novo sistema de governo. No ancoradouro da Ilha Grande, onde trocaria o “Parnaíba” pelo paquete a vapor “Alagoas”, Gastão de Orleans escreveria sua carta de despedida aos brasileiros.
A família imperial viveria no exílio, proibida, por decreto, de voltar ao Brasil. Logo na chegada à Europa, a imperatriz veio a falecer e, dois anos depois, d. Pedro. Gastão e a princesa passaram a maior parte dos trinta anos de desterro no castelo D'Eu, nos arredores de Paris.
Apenas em 1920, em razão dos preparativos para as comemorações do primeiro centenário da independência, foi assinada resolução que revogava o banimento da família imperial, bem como autorizava a trasladar para o Brasil os restos mortais do imperador e sua esposa. O conde d'Eu e seu filho mais velho, príncipe Pedro, retornariam ao Brasil em 1921, trazendo os despojos. Foram recebidos com faustos e homenagens da República agora consolidada.
Em fins do mesmo ano, já debilitada, faleceria a princesa Isabel e, em 1922, Gastão de Orleans, a bordo do navio Massilia, de regresso ao Brasil para as festividades do centenário. Seus corpos foram repatriados em 1953, inumados junto ao túmulo de d. Pedro e Teresa Cristina, no mausoléu imperial da catedral de Petrópolis, Rio de Janeiro.
A carta pertence ao fundo Família Vieira Tosta, de natureza jurídica privada, formado por documentos produzidos e/ou acumulados por Manuel Vieira Tosta (1807-1896), seu filho Manuel Vieira Tosta Filho (1839-1922) e genro, Luís Antônio da Silva Nunes (1830-1911). Nesse acervo podemos encontrar registros textuais e iconográficos, que vão desde correspondências e fotografias da família imperial a documentos cartoriais e jurídicos, além de impressos e periódicos, como os jornais dos príncipes (Correio Imperial, Correio Mirim e Correio Assu), editados pelos filhos da princesa Isabel e tipografados no próprio palácio de São Cristóvão.
Veja a transcrição da carta:
Conde d'Eu
Carta de despedida do Príncipe escrita do Parnaíba a 17 de novembro de 1889.
Aos brasileiros,
A todos os meus amigos que nestas terras me favoreceram com sua sincera e por mim tão apreciada afeição, aos companheiros que há longos anos já partilharam comigo as agruras da vida de campanha, prestando-me inestimável auxílio em prol da honra e segurança da Pátria Brasileira, a todos que na vida militar e civil, até a pouco se dignaram comigo colaborar, a todos aqueles a quem em quase todas as províncias do Brasil devo finezas sem número e generosa hospitalidade e a todos os Brasileiros em geral um saudosíssimo adeus e a minha mui cordeal gratidão.
Não guardo rancor de ninguém e não me acusa a consciência de ter cientemente a ninguém feito mal.
Sempre procurei servir lealmente ao Brasil na medida de minhas forças. Desculpo as acusações menos justas e juízos infundados de que por vezes fui alvo.
A todos ofereço minha boa vontade, em qualquer ponto, a que o destino me leve. Com a mais profunda saudade e intenso pesar afasto-me deste país, ao qual devi no lar doméstico ou nos trabalhos públicos, tantos dias felizes e momentos de imorredoura lembrança. Nestes sentimentos acompanham-me minha muito amada Esposa e nossos tenros filhinhos que debulhados em lágrimas conosco empreendem hoje a viagem de exílio. Praza a Deus que, mesmo de longe, ainda me seja dado ser em alguma coisa útil aos Brasileiros e ao Brasil.
Bordo da canhoneira [cruzador] “Parnaíba”, no ancoradouro da ilha Grande em 17 de novembro de 1889
Gastão de Orleans
ASCOM-Assessoria de Comunicação Social