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Novos editais de fomento aumentam a transparência e a agilidade da ANCINE, além de atender a antigas demandas dos agentes do mercado
Carta aberta ao mercado audiovisual
De Christian de Castro*:
Desde a criação da ANCINE, a política de fomento ao cinema e ao audiovisual coordenada pela Agência tem sido continuamente aprimorada, e é necessário que seja assim. Com diálogo e transparência, à medida que o mercado amadurece, novos mecanismos são criados, de maneira a estruturar uma indústria forte, com estímulo ao empreendedorismo e atenção às novas janelas de oportunidade que se abrem. Mudanças no comportamento do consumidor de conteúdos audiovisuais e aceleradas transformações tecnológicas tornam rapidamente obsoletos modelos que eram eficientes pouco tempo atrás, exigindo a adoção de novos formatos de fomento.
É para isso que o Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual - FSA - se reúne periodicamente. Contando com a ativa participação de representantes do mercado, além de membros do governo, Ministério da Cultura, do BNDES e da própria ANCINE, é o Comitê que estabelece as diretrizes de investimentos e os parâmetros de aplicação de recursos, bem como as normas e critérios de seleção dos projetos. Após mais de um ano de debate, reflexão e pesquisa, com embasamento técnico e a valiosa contribuição dos agentes do mercado, construímos mais um mecanismo inovador de estímulo à indústria: o recém-lançado edital de produção para cinema, em regime de fluxo contínuo, com critérios automáticos de pontuação, formulado para atender às necessidades de empresas produtoras e distribuidoras de diferentes portes e características.
Cabe sublinhar aqui que diretores, produtoras e distribuidoras sempre receberam notas, que geravam a classificação em rankings - o que é inevitável em qualquer processo seletivo, ainda mais envolvendo recursos públicos (uma vez que a ANCINE tem compromisso com a aplicação rigorosa e segura do dinheiro do contribuinte). A diferença é que, no passado, os critérios de pontuação e as notas deles resultantes não eram transparentes, nem divulgados para os proponentes. D iretores e empresas sempre foram julgados, pontuados e comparados entre si, mas isso acontecia longe dos olhos dos concorrentes, muitas vezes com base em idiossincrasias e preferências pessoais de pareceristas e membros de comissões . A parametrização das notas, aliás, também era uma antiga demanda do mercado, que precisa de previsibilidade nos processos seletivos, com pontuações aferidas de forma clara.
Além de valorizar a consistência das empresas proponentes, que receberão recursos públicos para a produção de projetos de longas-metragens de ficção, documentário e animação, o novo edital estabelece, pela primeira vez, faixas de investimento diferenciadas, de acordo com o porte, o histórico, o desempenho comercial e artístico e a estruturação financeira das empresas. Isso garante que projetos de diferentes ambições, tamanhos e orçamentos sejam contemplados de forma equilibrada, em conformidade com parâmetros públicos e objetivos de investimento, mitigando riscos e otimizando a utilização dos recursos.
Esse modelo induz a estruturação de novos arranjos e amplia a possibilidade de participação de produtoras e distribuidoras novas ou de pequeno porte e de diferentes regiões, uma vez que a nota mínima para habilitação dos projetos foi reduzida. Também estimula em particular as produtoras do CONNE (Centro-Oeste/Norte/Nordeste) e FAMES (MG, ES e Sul), pois, com a nova modalidade, queremos gerar uma demanda que antes não existia. Por outro lado, empresas maiores e com melhor histórico de desempenho poderão acessar mais recursos do que empresas menores e com pouca experiência – lembrando que os aportes do FSA não são a fundo perdido, mas investimentos que devem trazer retorno.
O novo edital faz uso de um banco de dados criteriosamente construído pela área técnica da ANCINE ao longo da última década: o OCA - Observatório do Cinema e do Audiovisual, que coleta e armazena dados primários sobre o audiovisual brasileiro e do banco de dados da Superintendência de Registro da Agência. Essa massa de informações foi finalmente traduzida em conhecimento capaz de orientar as decisões de fomento . O edital possibilita também maior agilidade na análise dos projetos, encurtando o tempo do processamento e acelerando a contratação - uma antiga demanda dos agentes do mercado. Tudo isso com mais transparência e controle: o regulamento para a pontuação de diretores e empresas produtoras e distribuidoras, de acordo com seu desempenho comercial e artístico (este com base na participação e premiação em festivais), é público e transparente.
A política de investimentos no cinema e no audiovisual precisa ser percebida e compreendida de maneira integrada. O novo edital com pontuação automática não substitui os outros mecanismos de fomento, ele os complementa. Em paralelo, continuam sendo lançados pela ANCINE editais de concurso, com processos seletivos que induzem a inovação de linguagem e a participação de novos entrantes. Nesses editais (alguns deles em parceria com a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura), pela primeira vez na história da Agência foram estabelecidas cotas raciais e de gênero, que se somam aos indutores regionais como formas de garantir a diversidade na produção cinematográfica nacional. Somados, esses editais de concurso aportarão R$ 250 milhões no mercado, enquanto o novo edital de fluxo contínuo para cinema conta com R$ 150 milhões.
O objetivo dos editais de fluxo contínuo – um segundo edital nesse modelo, destinado à produção de obras para a televisão, com R$ 130 milhões, será lançado em setembro – é valorizar a consistência da entrega e a capacidade empresarial das empresas proponentes, além de estimular a formação de arranjos competitivos, porque não existe um mercado forte sem empresas fortes. Mas a ANCINE opera ainda um terceiro nível de investimento: o suporte automático, que premia o histórico recente de desempenho comercial e artístico em cinema, televisão e outras janelas, com mais R$ 56 milhões.
É a combinação entre esses diferentes mecanismos de apoio – editais de concurso, fluxo contínuo e suporte automático – que viabiliza a produção de filmes de menor orçamento para o cinema e de conteúdos menos comerciais para a TV, uns e outros de inegável relevância cultural e artística, além de possibilitar o aumento da competitividade das empresas.
É preciso aprofundar a análise de qualquer edital lançado, sobretudo quando se trata de um modelo inovador de fomento, uma vez que opiniões superficiais e mal-intencionadas provocam transtorno desnecessário num momento que o setor precisa se unir pelo seu crescimento sustentável. Críticas são necessárias e serão sempre bem-vindas para que seja aprimorado o modelo; a ANCINE está preparada para prestar todas as informações e esclarecer todas as dúvidas.
A sociedade e os agentes do mercado podem ter certeza que continuaremos apostando na desburocratização, na agilidade, na transparência, no diálogo e no controle de processos, de forma a garantir o uso eficiente de recursos públicos na estruturação de uma indústria audiovisual dinâmica e atenta às novas possibilidades de crescimento.
*Christian de Castro é diretor-presidente da ANCINE