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CIÊNCIA
Técnicos dialogam sobre a experiência de usuários(as) da PrEP nos serviços públicos
Na última semana, profissionais do Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis (Dathi) do Ministério da Saúde participaram do “Café com ciência: resultados finais do Estudo Combina e conferência sobre políticas públicas de enfrentamento ao HIV no Brasil”. O evento contou com apresentações do coordenador do Estudo, Alexandre Grangeiro, e da pesquisadora colaboradora, Márcia Couto.
O Estudo Combina foi realizado entre 2015 e 2022 pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com financiamento do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. O objetivo do projeto foi avaliar como as pessoas usam os métodos de prevenção ao HIV disponíveis nos serviços públicos de saúde, como as profilaxias pré e pós exposição ao HIV (PrEP e PEP). Na ocasião, Alexandre Granjeiro e Márcia Couto abordaram pesquisas realizadas a respeito do TelePrEP – em que profissionais de saúde prescrevem a profilaxia após teleconsultas – e a PrEP sob demanda, quando a pessoa toma a profilaxia antes de um possível contato com HIV.
Sobre o TelePrEP, os resultados apontaram que os(as) usuários(as) consideram o serviço como mais conveniente, diminuindo potenciais constrangimentos de uma consulta presencial. Além disso, reportaram redução de estresse associado ao estigma em locais que oferecem tecnologias relacionadas ao HIV, segurança no atendimento remoto e reforço na ideia de simplificar o cuidado para a população. Já sobre a PrEP sob demanda, foi possível observar que a tecnologia permite mais protagonismo e cuidado com a saúde, reduzindo a probabilidade de a pessoa interromper a prevenção. Conforme o estudo, os(as) usuários(as) também entendem essa modalidade como menos prejudicial à saúde, facilitando o gerenciamento e frequência das práticas sexuais.
Márcia Couto ressaltou os achados quanto as barreiras e aos facilitadores no acesso, na adesão e na continuidade do uso das PrEP e PEP. “Nos primeiros anos da PrEP, a partir de 2018, as pesquisas mostram que havia discriminação por parte de profissionais da saúde, principalmente com adolescentes, homens gays e bissexuais, por associar [o uso] à promiscuidade”. Ela também informou que mulheres trans e travestis – entrevistadas durante e após a pandemia de covid-19 – reconhecem os serviços que ofertam a PrEP como lugares de acolhimento e confiança, mas a percepção de julgamento relacionado ao trabalho sexual ou à identidade de gênero ainda persiste como barreira de acesso.
O coordenador-geral de Vigilância de HIV e Aids (CGHA), Artur Kalichman, explica que estigma e discriminação são determinantes sociais que funcionam como barreiras para o acesso às ferramentas de prevenção ao HIV, e destaca a importância do Brasil Saudável. “É um compromisso do Brasil Saudável, com a colaboração de seus 14 ministérios, reduzir as iniquidades e ampliar os direitos humanos e a proteção social, pois entendemos que algumas infecções e doenças afetam de forma diferente pessoas em situações de maior vulnerabilidade social”.
Já no caso da PEP, os estudos apontaram que usuários(as) e profissionais de saúde a percebem como uma “remediação” e não como método preventivo, gerando vergonha, ansiedade e o sentimento de falhar em não se proteger. A pesquisadora alertou também para os aplicativos de relacionamento, que funcionam como fontes de trocas de informações sobre prevenção, principalmente entre homens que fazem sexo com outros homens, bem como, o papel das redes sociais e de influenciadores. Assim, ela pontuou que as estratégias de informações sobre saúde sexual precisam ser descentralizadas e contar com a participação de pessoas notórias para as populações vulneráveis ao HIV.
Granjeiro abordou os desafios para a eliminação da aids enquanto problema de saúde pública até 2030. O pesquisador informou que outros países mais atingidos pelo vírus como Tanzânia, Botswana, Zimbabue, Ruanda e Essuatíni, já alcançaram as metas 95-95-95. “Pensei em três aspectos estruturais para a resposta à epidemia de HIV no Brasil. O primeiro é o financiamento. Não tem como existir uma resposta sem dinheiro. A outra questão é a participação social. Precisamos aprofundar a reflexão do porquê houve redução na participação social nas políticas de HIV. E, o terceiro, são os determinantes sociais”, explicou.
Segundo o pesquisador, os determinantes sociais da epidemia de aids mudaram ao longo dos anos, e, por isso, é necessário reestruturar a rede de serviços. Em sua fala, também levantou a importância de regulação das plataformas de encontro, considerando a necessidade de prevenção na transmissão de hepatites virais, HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis. “A eliminação do HIV precisa ser um pacto da sociedade. O compromisso precisa sair do Departamento e ser compartilhado com todos”, afirma.
No fim do encontro, Artur Kalichman ressaltou a importância de se basear na ciência para elaborar a resposta ao HIV e à aids no Brasil. Segundo ele, os dados apontam uma diminuição da incidência de novos casos de HIV nos locais em que as pessoas acessam a PrEP. “É obvio que precisamos tratar as pessoas, mas essa não deve ser a única forma de evitar novos casos. Prevenir é melhor do que remediar. Vimos em diversos países da Europa que a redução de novas infecções ocorreu, de fato, com a chegada da PrEP”.
Lorany Silva e Ádria Albarado
Ministério da Saúde