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AGU pede ao STF a concessão de cautelar para suspender lei do estado de São Paulo que autoriza privatização da Sabesp
Estação de tratamento de água - Foto: Sabesp
A Advocacia-Geral da União (AGU) enviou nesta quinta-feira (18/07) ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestação favorável à concessão de medida cautelar para suspender os efeitos da Lei estadual nº 17.853/2023, que autoriza a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
A manifestação ocorreu no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1182, proposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Além de questionar a constitucionalidade da lei, a agremiação também pede a suspensão da eficácia de atos administrativos do Conselho de Administração da companhia e do Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização (CDPED).
De acordo com o PT, a lei estadual e os atos destinados à privatização da Sabesp violam os princípios da Administração Pública previstos no artigo 37 da Constituição Federal: legalidade, moralidade, impessoalidade, isonomia, publicidade e eficiência.
Na peça enviada ao STF, a AGU destaca que os fatos narrados e os documentos constantes nos autos da ADPF nº 1182 mostram que esses princípios não foram observados no processo de desestatização da empresa, que é uma sociedade constituída por ações de mercado que integra a administração indireta do estado de São Paulo.
A Advocacia-Geral ressalta a existência de conflito de interesses no processo de desestatização, o que viola os princípios da impessoalidade e da moralidade. O conflito envolve, segundo destaca a peça, a executiva Karla Bertocco Trindade. De acordo com as informações constantes nos autos, Trindade participou de diversas reuniões como presidente do Conselho de Administração da Sabesp. Também envolveu-se diretamente em processos decisórios relevantes para a concretização do programa de desestatização da companhia.
O conflito de interesses ocorre, segundo destaca a AGU, pelo fato de que a executiva também ocupava, até recentemente, cargo no Conselho de Administração da Equatorial Energia, única empresa que, no curso do processo de privatização, permaneceu com interesse em ser acionista da Sabesp na condição de investidor de referência.
Para a AGU, o exercício simultâneo dos dois cargos pela executiva, um em companhia estatal e outro em empresa privada participante do processo de desestatização na condição de competidora, constitui ameaça aos princípios da impessoalidade e da moralidade e forte indício de grave conflito de interesses. “Conquanto a duplicidade de funções, a princípio, não constitua ilícito, é necessário conciliar essas atividades, de modo a resguardar o interesse público. Isso porque, eventual aceitação da mesma integrante em funções públicas e privadas, simultaneamente ou logo após, pode gerar conflitos entre os interesses público e privado”, assinala a manifestação.
Em reforço ao argumento apresentado ao STF, a AGU menciona a vedação prevista na Lei nº 12.813/2013, que trata de situações de conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego do Poder Executivo federal. A Advocacia-Geral assinala que tal conflito pode permanecer mesmo após o exercício de cargo público, razão pela qual há a previsão de período de quarentena para ex-ocupantes desses cargos.
Como lembrou a AGU, o próprio STF validou vedações legais similares previstas na Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais) no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7331. Nesse caso específico, a Corte firmou o entendimento de que "os vetos fixados pela legislação não ferem a Constituição e nem violam direitos fundamentais, mas, sim, criam filtros para garantir a moralidade da administração pública e evitar conflitos de interesses”.
Ações com valores subdimensionados
A AGU também destaca na manifestação que existem evidências de que os valores das ações da Sabesp foram subdimensionados, como assinalado na ação proposta pelo PT. A constatação consta do Relatório de Avaliação Econômico-Financeira (Valuation), que aponta como valor de mercado R$ 103,90 por ação, 55% maior que o valor aceito pelo estado de São Paulo.
Ressalta a peça: “A petição inicial apresenta uma tabela com valores indicados pela Oferta Equatorial (R$ 67,00), pela Cotação B3 (R$ 74,97), pelo referido Relatório Valuation (R$ 85,58/R$ 103,90), a qual demonstra que o valor ofertado pela Equatorial por ação, ainda que acima do mínimo definido pela SAPESP, é significativamente inferior ao valor de mercado”. E acrescenta: "o encaminhamento da venda à Equatorial por apenas R$ 67,00 evidencia a debilidade dos estudos de avaliação do valor da ação, em clara venda que lesará o erário bandeirante".
Por fim, a AGU argumenta que o prazo de apenas três dias para inscrição dos competidores interessados na condição de investidor de referência da Sabesp foi extremamente exíguo, o que também pode ter comprometido a lisura do processo, sobretudo em razão da complexidade e do volume de documentos a serem apresentados.
O cronograma de desestatização fixado pelo estado de São Paulo prevê que, na próxima segunda-feira (22/7), será efetivada a liquidação da oferta pública de distribuição secundária de ações ordinárias de emissão da Sabesp. Para a AGU, a eventual demora na concessão da medida cautelar pedida pelo PT na ADPF poderá causar “prejuízos irreparáveis para os cofres estaduais, em especial diante da evidência de defasagem no preço das ações” da companhia.