Novidades da Ciência, Tecnologia e Inovação para o setor
A indústria mundial de fertilizantes enfrenta um desafio contínuo de melhorar seus produtos para aumentar a eficiência e minimizar os possíveis impactos ambientais. Esses objetivos podem ser alcançados por meio de melhorias de fertilizantes já em uso ou através do desenvolvimento de novos tipos de fertilizantes.
O mercado mundial de fertilizantes em 2019 foi estimado em US$ 155,80 bilhões, com perspectivas de que registre um crescimento de 3,8% ao ano, durante o período 2020-2025. A partir de 2021, espera-se que as principais inovações tecnológicas do setor, junto com a crescente demanda por fertilizantes de base biológica e micronutrientes, impulsionem o mercado. Os tradicionais produtos que representam os compostos NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio) ainda dominam os números do setor em volume, mas novas tecnologias, nos mais diversos elos da cadeia produtiva, se mostram promissoras para entrega de valor nos próximos anos.
Nesse sentido, uma visão mais detalhada sobre o estado da arte da ciência, tecnologia e inovação (CTI) na cadeia mundial de fertilizantes e nutrição de plantas é essencial para o desenvolvimento de políticas públicas para o setor. No caso dos fertilizantes, o foco deve estar, ao mesmo tempo, na produção em larga escala e na inovação tecnológica. Esses são apontados como fatores de competitividade internacional para a geração de produtos inovadores e adequados aos sistemas de produção agropecuária cada vez mais sustentáveis.
No cenário internacional, além de necessidade de aumentar a eficiência nos processos de produção e uso dos fertilizantes tradicionais (NPK), há oportunidades importantes em torno de novos fertilizantes, fontes alternativas de nutrientes e condicionadores de solos. Além deles, no cenário da inovação merecem destaque produtos promotores da produtividade (estimulantes vegetais), como os organominerais, agrominerais silicáticos, bioestimulantes, microrganismos promotores de crescimento vegetal, entre outros. Diante desse cenário, as principais tendências mundiais em ciência, tecnologia e inovação na cadeia de fertilizantes e nutrição de plantas seguem as inclinações de mercado, buscando novos fertilizantes com foco na eficiência, ao mesmo tempo em que cresce a preocupação com a sustentabilidade ambiental e social. Podemos agrupá-las em quatro grandes áreas: (a) Novos fertilizantes e fertilizantes mais eficientes; (b) Fertilizantes Organominerais; (c) Sustentabilidade ambiental e (d) Indústria 4.0 e plataformas tecnológicas. Nesse sentido, podemos destacar os seguintes temas estratégicos: biofertilizantes, nanoargilas, fertilizantes de liberação controlada (controled release), amônia verde, adjuvantes e aplicação por drones, economia circular de rejeitos minerais, química de solos, regeneração e condicionamento de solos e outros. Em relação às políticas públicas para fertilizantes, em nível internacional, pode-se destacar que as estratégias de países líderes em inovação tecnológica em fertilizantes estão voltadas da matéria-prima aos produtos finais, a produtividade no campo e ao impacto ambiental.
Estratégias de cooperação e alianças para PD&I em fertilizantes devem incluir empresas do setor, universidades, instituições de P&D (setores público e privado), dentre outros atores. Os arranjos para obter inovações devem incluir acordos entre universidades e laboratórios governamentais de pesquisas e departamentos de pesquisa de empresas privadas dentro e fora da indústria de fertilizantes. No panorama global da CTI, os recursos financeiros gastos com PD&I da indústria de fertilizantes são relativamente baixos em relação ao faturamento total dessas empresas. Alguns dos maiores desafios de nosso tempo requerem transformações significativas dentro da indústria de fertilizantes, que incluem maiores investimentos na área de P&D, estreita colaboração com parceiros em toda a cadeia para impulsionar o desenvolvimento sustentável na agricultura e economia mundial.
Analisando os pedidos de patente depositados no Brasil entre 2010 e 2021, que somaram um total de 369 documentos no campo tecnológico de fertilizantes nitrogenados, verifica-se que os depositantes desses pedidos de patente são oriundos de EUA, Brasil, Alemanha, Holanda, Noruega, Canadá e França. Entre os principais depositantes, destacam-se as empesas Yara, Basf, Koch e Rhodia. Em um aspecto mais geral, verificou-se que ocorrem mais frequentemente os campos tecnológicos relativos a: fertilizantes contendo ureia (o fertilizante mais consumido no Brasil), compostos e aditivos para regular a urease e a nitrificação no solo, fertilizantes contendo sais de amônia ou a própria amônia (como o nitrato de amônia) e misturas de fertilizantes. Em caráter mais aprofundado (leitura e análise de cada pedido de patente), verificaram-se pedidos de patente relacionados a composições de fertilizantes nitrogenados contendo aditivos, incluindo condicionadores de solo, biocidas e estabilizadores. Dentre as composições fertilizantes estabilizadas, têm mais relevo as composições com inibidores de urease, em especial os compostos triamida, e de nitrificação. A presença de enxofre nas composições também é frequente, bem como de micronutrientes como cobre, boro, zinco. Quanto ao desenvolvimento de tecnologias voltadas para a forma de apresentação dos fertilizantes, há predominância dos fertilizantes sólidos, seja na forma granular, em pó ou pellet, e também a utilização de revestimento, laminação e encapsulamento. Nota-se também depósito de pedidos no campo dos fertilizantes líquidos. Ainda, merecem destaque as tecnologias de anti-dusting destinadas a evitar perdas antes da aplicação do fertilizante no solo e também as composições fertilizantes com controle de liberação dos nutrientes no solo. Para os fosfatados (270 pedidos de patentes depositados entre 2010 e 2021) e potássicos (141 pedidos de patentes depositados entre 2010 e 2021), a principal busca tecnológica no setor ocorre em termos de tecnologias relativas a revestimento e encapsulamento, à presença de enxofre na composição, à presença de micronutrientes (como cobre, zinco e boro), fertilizantes líquidos, polifosfatos, tecnologia em polímeros, presença de ácidos húmicos e fúlvicos, zeólitas, micronização e outros. Ainda, foram verificadas patentes relativas a processos térmicos. Boa parte dos depósitos não se refere a produtos desenvolvidos especificamente para as condições da agricultura tropical brasileira. Dentre os depositantes nacionais, foi verificado um grande número de pessoas físicas e universidades em detrimento às empresas.
Um levantamento realizado durante a fase de diagnóstico para a elaboração do PNF permitiu identificar a existência de apenas três empresas produtoras de fertilizantes que atuam em PD&I atualmente no País, a saber: Compass Minerals (Iracemápolis, SP), Heringer (CEPEC, CEMAP e CEAGRO - Centros de Excelência da Heringer) e Yara Knowledge Grows Center (Sumaré, SP). Além dessas empresas, outras 77 instituições privadas de pesquisa cadastradas junto ao Mapa estariam aptas para atuarem em PD&I para fertilizantes. É preciso incentivá-las a investir em inovação, incentivar a criação de um ambiente com segurança jurídica visando promover parcerias público-privadas, capazes de aproveitar a capacidade já instalada em ambos.
Esse esforço depende de um robusto Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia orientado para a promoção da Inovação. Orientar o esforço de CT&I para o suporte ao desenvolvimento nacional é um dos desafios a ser enfrentado. Considerando a baixa disponibilidade instalada de produção das principais fontes de fertilizantes, é fundamental que sejam desenvolvidas estratégias de crescimento da produção nacional e, por outro lado, sejam criadas estratégias de CT&I que não apenas promovam políticas de incentivo às inovações tecnológicas em fertilizantes de maior eficiência agronômica e mais adequados ao solo brasileiro, mas também promovam o desenvolvimento de tecnologias alternativas para nutrição de solos, a sustentabilidade ambiental e a economia circular, reduzindo a carga de carbono no agronegócio brasileiro.
Cumpre destacar ainda o potencial de redução do uso de fertilizantes/hectare através da aplicação das tecnologias da indústria 4.0 para impulsionar a agricultura de precisão. Contudo, essas oportunidades somente podem ser atingidas com políticas pragmáticas que removam barreiras como fechar as lacunas da banda larga rural.
Neste Plano Nacional de Fertilizantes (PNF), ressalta-se que devem estar contemplados novos processos (químicos, físicos e biológicos) e matérias-primas (minerais, orgânicas, incluindo resíduos) para produção industrial de insumos fertilizantes como fontes de nutrientes ou condicionadores de solo.
O modelo de Agricultura Tropical Sustentável baseado em ciência e desenvolvido ao longo das últimas cinco décadas transformou o Brasil de país importador de alimentos, na década de 1970, para um dos maiores players do agronegócio mundial. Em vários aspectos, a agricultura brasileira é modelo de agricultura tropical para o mundo, e tecnologias para nutrição de plantas com foco na sustentabilidade como o uso de microrganismos, vêm ganhando cada vez mais destaque. Um caso de sucesso é a fixação biológica de nitrogênio (FBN), que hoje é a principal fonte de nitrogênio da agricultura brasileira, contribuindo para diminuir a importação de fertilizantes. Na produção de cana-de-açúcar, destaca-se o uso de bactérias diazotróficas e de fungos micorrízicos, além de bactérias promotoras de tolerância à seca. Além disso, há tendência crescente do uso de microrganismos associados a plantas por seu potencial na recuperação de áreas degradadas, na redução da emissão de GEE, na diminuição de riscos de contaminação do solo e da água e no uso racional de insumos. Entre os grandes desafios da nossa agricultura hoje, está o desenvolvimento de sistemas de produção agropecuária, considerando características regionais, o uso racional e os novos cenários climáticos. Aqui, mais uma vez, aparecem os insumos biológicos. O desenvolvimento de uma ampla gama desses insumos tem potencial de otimização ou substituição do uso de fertilizantes. A natureza circular dos insumos biológicos (inoculantes e biofertilizantes) aumenta a eficiência dos recursos e reduz as perdas de nutrientes. Além disso, podem promover a tolerância a estresses abióticos, melhorando a resiliência dos agroecossistemas diante das mudanças do clima.
Outro aspecto relevante em relação ao uso racional de fertilizantes é o mapeamento das reais necessidades dos solos agricultáveis no País. Ao longo das últimas décadas, os sistemas de produção agrícola, com uso intensivo de tecnologia na adubação e na correção de solo contínuas, ampliaram a fertilidade do solo nas principais regiões produtoras do País. Atualmente, essas mesmas áreas poderiam até mesmo dispensar o uso de fertilizantes em algumas safras. Nesse sentido, percebe-se uma área de atuação de PD&I que pode trazer informações relevantes para definir recomendações, seguindo os princípios de uso racional para esses solos. Ainda nesse sentido, há necessidade do desenvolvimento de máquinas, equipamentos e processos de automação para empreendimentos de pequena e média escala, com especial ênfase em aumento de eficiência na utilização de fertilizantes. Tecnologias e plataformas digitais para uso na agricultura associados à melhoria do uso de nutrientes também devem estar contemplados. A transferência dessas novas tecnologias é outro aspecto importante. A difusão de ferramentas para treinamento presencial e virtual sobre técnicas e boas práticas para uso racional de fertilizantes e novos fertilizantes são de fundamental importância para a implementação dessas práticas.
A capacitação contínua de todos os atores envolvidos no setor de fertilizantes e nutrição de plantas é um tema de fundamental importância para alavancar o setor no Brasil e deve ser considerada ação prioritária dentro do Plano Nacional de Fertilizantes (PNF 2050). Para isso, devem ser estudados/abordados temas relevantes envolvendo desde a prospecção de recursos minerais (convencionais e alternativos) usados como matérias-primas para produção dos fertilizantes e as inovações em tecnologias de produção em si, com foco primordial em tecnologias disruptivas, até o uso eficiente, seguro e sustentável desses produtos fornecedores de nutrientes, nas áreas agrícolas. O estímulo a investimentos em PD&I por meio de fontes de financiamentos diversas é de importância urgente e estratégica e, nesse contexto, devem ser levadas em consideração ações que: promovam e estimulem a inovação nas ITCs no País; Incentivem a construção de redes de pesquisa, alianças e projetos internacionais de PD&I, parques e polos tecnológicos; e fomentem, principalmente, a formação e capacitação de recursos humanos qualificados na área de fertilizantes/nutrição de cultivos.
O Brasil apresenta pesquisa de qualidade em várias das áreas do setor de fertilizantes, provenientes das Universidades, da Embrapa e de outras instituições. O marco diferencial da CT&I em Fertilizantes e Insumos para a nutrição de plantas no Brasil foi a criação da Rede FertBrasil em 2009.
Uma indicação clara do setor privado, com aderência dos ICTs no diagnóstico de CT&I, foi a necessidade da criação de um Centro de Excelência em Fertilizantes, liderado pela Embrapa, em uma estrutura própria, público privada, que contemple a maior lacuna para a inovação em produtos e processos em novos fertilizantes e insumos para a nutrição de plantas no Brasil. Essa estrutura seria composta por laboratórios especializados em estudos de processos químicos, físicos e biológicos de transformação de matérias-primas para a indústria, e, principalmente, uma estrutura de aumento de escala (scale up) para que os produtos e processos sejam finalizados para serem produzidos em escala industrial. Na prática, sem uma estrutura que ofereça especialistas em tecnologias em fertilizantes, as ICTs inventam os produtos e processos de forma ativa, validam em escala de bancada e em campo agrícola, levando a escala de maturação tecnológica até os níveis 3 a 5 (validação em ambiente experimental de laboratórios), em uma escala até o nível 9 na escala TRL/MRL (sendo este o uso do produto em todo seu alcance e quantidade, e produção estabelecida).