Benefícios da exploração espacial
Benefícios de inovação da exploração espacial
Quase sempre a história das invenções está cercada de erros e acertos, contando com a colaboração de inúmeras pessoas e não apenas de um indivíduo. Quando, finalmente, a inovação quase que definitiva matura-se, seu responsável algumas vezes recebe conhecimento. A exploração espacial é, entretanto, resultado de um esforço de inúmeras pessoas, nunca um empreendimento individual. Exceto por casos excepcionais, raramente seus inventores tornam-se conhecidos publicamente: a sociedade tem dificuldades em reconhecer a origem da invenção.
Para tornar mais claros os benefícios obtidos no passado com a exploração espacial, apresentamos abaixo uma lista de inovações oriundas de desenvolvimento de tecnologia espacial. Tal lista não está completa. Outros desenvolvimentos que advieram da busca por soluções inovadoras de manutenção de vida no espaço podem ser apreciados na referência fornecida abaixo, de onde podemos apreciar algumas aplicações:
- Protetores almofadados para calçados de corrida. A partir de um processo de montagem de capacetes espaciais, o engenheiro da NASA Frank Rudy procurou uma grande empresa de calçados e ofereceu a tecnologia na produção de tênis esportivos. Hoje em dia, quase todos os calçados usados em corridas de longa distância requerem o uso de absorvedores de impacto.
- Equipamentos de segurança para bombeiros. Dispositivos espaciais deram origem a novos e leves recursos de respiração em uso por equipes de salvamento em incêndios. Antes de 1971, esses equipamentos chegavam a pesar mais de 13 quilos.
- Ranhuras no asfalto. Foram engenheiros espaciais que descobriram o efeito de redução de escorregamento pela criação de ranhuras no asfalto. Esse arranjo foi, então, aplicado com sucesso para evitar acidentes na decolagem e aterrissagem de aviões, e são usados em larga escala em estradas e rodovias.
- Fontes limpas de energia. O desenvolvimento de painéis solares eficientes (dispositivos que convertem luz do sol em eletricidade) foram desenvolvidos a partir da busca por fontes de energia para satélites e outros engenhos espaciais, o que ocorreu na década de 80.
- Óculos de sol. Protetores oculares mais eficientes de radiação ultravioleta foram desenvolvidos a partir de coberturas protetoras de capacetes de astronautas.
- Comida para bebês. Inúmeros países passaram a adicionar componentes sintéticos presentes no leite materno à alimentação disponível para bebês. Tais componentes foram desenvolvidos com base em pesquisa feita com certas algas na exploração do espaço.
- Asa Delta. A partir da busca por sistemas de reentrada usadas no programa Gemini da NASA, um tipo leve e simples de desenho de asas atraiu o interesse de entusiastas de voo planar em todo o mundo. Esses desenhos deram origem às famosas “asas-delta”.
- Nitinol. O Nitinol é uma liga metálica usada em aparelhos dentários. Seu desenvolvimento se deu a partir de pesquisa por dispositivos durante o lançamento de satélites depois do último estágio de foguetes.
- Unidades de terapia intensiva. Equipamentos de manutenção da vida foram desenvolvidos a partir de programas espaciais tripulados para o registro e monitoramento do estado fisiológico de astronautas. Essa tecnologia é hoje amplamente usada em unidades de terapia intensiva (UTI).
- Roupas esportivas que absorvem calor. Muitas roupas esportivas têm materiais oriundos de vestimentas isolantes de astronautas. Pacotes de gel que absorvem calor são usados próximo ao corpo na vestimenta, de forma a reduzir o efeito de desconforto térmico.
- Hidroponia avançada. A busca por meios de sobrevivência em missões espaciais de longa duração requer o desenvolvimento de plantas que fornecem alimento, oxigênio e água, o que reduz a necessidade de fornecedores externos. É provável que tais pesquisas beneficiem ainda mais a produção agrícola e a alimentação humana por desenvolverem métodos de crescimento em ambientes com recursos reduzidos. Disso surgirão aplicações para regiões áridas e desertos.
- Soluções para fornecimento de água. Ainda sob influência de pesquisas espaciais no aproveitamento de rejeitos, a remoção de impurezas e purificação da água abre espaço para o seu tratamento avançado, com importantes aplicações para o problema de abastecimento humano desse precioso líquido.
- Kits de medidores de pressão. Um meio portátil de monitorar a pressão sanguínea de astronautas foi desenvolvido já nos primeiros voos tripulados. O desenvolvimento tornou-se a tecnologia chave existente nos modernos kits de medidores de pressão.
- Alicate hidráulico de salvamento. Versões mais leves e eficientes desses alicates são usadas por equipes de bombeiros para eliminar obstáculos durante salvamentos. Essa tecnologia foi usada pela primeira vez em missões espaciais.
- Joystick. O sistema manual de controle, conhecido como “joystick” foi usado pela primeira vez nas missões Apollo. Além de videogames, essa inovação é aplicada a outros dispositivos, como equipamentos cirúrgicos, controles de aeronaves militares, helicópteros, drones e outros.
- Tomografia computadorizada. Tomógrafos computadorizados, inicialmente usados na detecção de defeitos em componentes de dispositivos espaciais, são presentemente importantes ferramentas de diagnóstico médico.
- Equipamentos de musculação e condicionamento físico. A pesquisa espacial buscou meios manter o condicionamento físico de astronautas em ambientes espaciais (baixa gravidade). Esta é a origem de muitos dos modernos equipamentos de musculação.
As justificativas para investimentos nacionais em um programa têm origem nos benefícios resultantes desses investimentos. Hoje, é certo que a exploração espacial das últimas décadas modificou a vida moderna não tanto pelas descobertas científicas que surgiram como resultado dessa exploração. Elas tiveram como resultado a criação de inúmeros novos mercados que se mantêm de forma perene e lucrativa. Por exemplo, hoje é praticamente impossível falar em comunicação a longas distâncias sem de certa forma citar um componente ligado ao espaço. Um exemplo notório é a transmissão de imagens via satélite, cuja dependência de infraestrutura espacial é orgânica em sua cadeia de qualidade e dela inseparável em qualquer escala de tempo no futuro.
A importância da manutenção de um Programa Espacial para países em desenvolvimento é considerável. Maior ainda é sua importância para um país do tamanho do Brasil. Para ilustrar essa afirmativa, basta comparar os preços médios de commodities e de artefatos espaciais no mercado internacional (Fig. 1). Tal comparação evidencia a dependência econômica entre países e a necessidade de se ampliar investimentos no espaço, bem como na transferência de tecnologias do espaço para processos industriais nacionais.
Benefícios econômicos
Fig. 1 Valor médio de um quilograma de commodity comparado a um quilograma de tecnologia espacial.
O mercado espacial
Os benefícios econômicos da exploração espacial podem ser divididos em dois: os benefícios diretos – como aqueles obtidos diretamente a partir da cobrança de serviços que usem o espaço – e os benefícios indiretos.
Para se ter uma ideia dos indiretos, perguntas pertinentes são: quanto vale um sinal de alerta de desastre provido por um sistema de satélite? Qual o valor dos benefícios do planejamento avançado de colheitas, a previsão de volumes de água para agricultura e para a população? Qual o valor de uma floresta inteira (Fig. 2) salva por meio de ações tempestivamente planejadas com base na análise avançada de imagens ópticas ou de radares instalados como cargas úteis de satélites?
Valores indiretos podem ser de mais difícil determinação quantitativa, mas todos concordam que eles são elevados.
Fig. 2 Imagem de satélite com radar de abertura sintética mostrando a evolução no tempo de um desmatamento na região do Mato Grosso em 2016. Imagens como essa ajudam na execução de políticas de proteção ambiental em toda Amazônia legal, que tem claros benefícios indiretos. Fonte: CENSIPAM.
Do lado da oferta, os principais atores do mercado espacial podem ser divididos em dois: o governo e o setor privado. Eles fazem parte de uma extensa cadeia de valor com duas principais dimensões:
- uma força de “baixo para cima” ou da indústria de lançadores ou artefatos responsáveis pela disposição de infraestrutura no espaço;
- uma força “de cima para baixo” ou de amplos setores responsáveis pela manutenção, operação e tratamento de serviços espaciais, bem como fornecedores de tecnologia dedicada.
Entre esses dois grandes grupos, as agências espaciais têm papel fundamental por, muitas vezes, operarem em ambos os segmentos ou realizarem a ligação entre esses grupos, coordenando e executando missões espaciais.
Do lado da demanda, o mercado apresenta dois grandes grupos:
- Instituições governamentais que produzem tecnologia espacial ou geram missões espaciais de variado interesse, desde aplicações no mercado de telecomunicações até monitoramento de recursos terrestres, passando por aplicações militares, missões tripuladas ou planetárias de interesse científico;
- Mercado internacional, o qual é formado por inúmeras empresas privadas ou de capital misto, que fornecem serviços baseados no espaço tais como sensoriamento remoto e telecomunicações, dentre outros.
Dessa forma, existe uma relação simbiótica do mercado internacional com as instituições governamentais, uma vez que a demanda institucional alimenta o mercado de lançadores, sem os quais não existiria demanda puramente privada.
Fig. 3 Divisão, por função, de uso de satélites operacionais no mundo. Fonte: Satellite Industry Association.
Independente das motivações para o mercado espacial, quais são os seus números? De acordo com relatório recente do grupo Tauri (Satellite Industry Association), o mercado espacial internacional teve um crescimento médio da ordem de 3% entre 2014 e 2015, com lucros globais da ordem de USD 208 bilhões. Desse lucro, 60,5% está relacionado a serviços de satélites, 28,7% relacionado à infraestrutura de solo, 2,9% associado à indústria de lançadores e 7,8% ligado à manufatura de satélites. Os ganhos da indústria de satélite cresceram o dobro da indústria global nos últimos dez anos (4% em 2014, comparado a 2,6% do crescimento econômico mundial). A Fig. 3 ilustra graficamente a divisão de uso de satélites operacionais por função. Como é possível ver, a maior parte é usada para comunicação comercial, sendo de destaque o uso para observação da Terra.
Segundo esse mesmo relatório, o número de satélites em órbita aumentou aproximadamente 40% nos últimos cinco anos, sendo que a maior contribuição adveio de pequenos satélites em órbitas terrestres baixas (altitudes abaixo de 2000 quilômetros). Com relação ao crescimento por segmentos em 2015, temos:
- Um crescimento de 4% observado em serviços de satélites, sendo que o maior ímpeto de crescimento é dado por serviços ao consumidor;
- Um crescimento de 4% em serviços de fabricação de satélites caracterizado por alto número de lançamento de satélites de valor mais elevado em 2015;
- Um decréscimo de 9% em serviços de lançamento, com redução no número de demandas comerciais;
- Um crescimento de 1% no setor de equipamentos de solo (dispositivos para consumidores e redes).
O maior crescimento de operação de satélite (cerca de 10%) foi observado no setor de serviços de observação da Terra, o qual inclui aplicações para agricultura, detecção de mudanças na superfície, meteorologia e levantamento de recursos.
Fig. 4 Lançamento do SERPENS I pela Estação Espacial Internacional. Iniciativas da AEB, como o SERPENS, seguem as expectativas globais de aplicação para nanossatélites para a próxima década.
Com relação ao futuro, espera-se uma explosão no crescimento da indústria de satélites muito pequenos (com massa abaixo de 10 kg). Em números, espera-se um crescimento da ordem de 13% ao ano entre 2016 e 2022 (Relatório “2017 Nano/Microsatellite Market Forecast”, Space Works). Essas projeções implicam no lançamento de aproximadamente 3000 satélites. O setor comercial e civil continua a alimentar a demanda por nanossatélites e uma divisão das aplicações previstas segundo o relatório da Space Works pode ser vista na Fig. 5. De acordo com essa divisão, há pouca expectativa para o setor de comunicações nas aplicações de nanossatélites, talvez por conta de restrições tecnológicas. Já a observação da Terra concentra as maiores aplicações, com destaque para o sensoriamento óptico remoto.
A Agência Espacial Brasileira (AEB) já participa dessa iniciativa, tendo lançado o programa SERPENS, que pretende reunir projetos de nanossatélites na forma de consórcio entre universidades e centros de pesquisa, através da sua Plataforma E2T.
Fig. 5 Divisão de aplicações esperada pelo mercado de nanossatélites para o período 2016-2022.
Referências
NASA Technologies Benefit Our Lives (acesso em abril de 2018)