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Declaração do presidente Lula da Silva, por ocasião da visita do presidente Evo Morales
Declaração à imprensa do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, por ocasião da visita de Estado do presidente da Bolívia, Evo Morales
Palácio do Planalto, 15 de fevereiro de 2007
Excelentíssimo senhor, companheiro Evo Morales, presidente da República da Bolívia, Senhoras e senhores ministros da Bolívia,Senhoras e senhores ministros do Brasil
Meus amigos, minhas amigas,
Companheiros da imprensa brasileira e da imprensa boliviana,
É com grande satisfação e alegria que recebo uma vez mais aqui o presidente Evo Morales. Sua visita praticamente coincide com o primeiro aniversário de seu mandato presidencial.
A eleição do companheiro Evo constitui-se num marco histórico para a Bolívia.
Um país com o desafio de usar suas riquezas naturais para a prosperidade de seu povo. Um país que está reconstruindo suas instituições com ampla participação popular.
Bolívia e Brasil avançam juntos na busca de um modelo de desenvolvimento com mais democracia, justiça, igualdade e progresso para todos, sobretudo para os excluídos. Nessa caminhada, o povo boliviano tem, e sempre terá do Brasil, a solidariedade e o apoio para que encontre seu próprio destino.
Em um relacionamento tão intenso, nem sempre nossos pontos de vista coincidem e nem todas as prioridades e soluções são as mesmas.
Mas essas diferenças são pequenas se compararmos com aquilo que nos une.
Temos um grande potencial de iniciativas comuns a ser explorado.
Esta visita permitiu dar continuidade a nosso diálogo franco, aberto e construtivo.
Sem condicionantes, sem imposições, sem ameaças ou rupturas. É assim que se relacionam países amigos e soberanos.
Os acordos que assinamos constituem a base de uma parceria estratégica e mostram a amplitude e a intensidade das relações entre nossos países, que vão desde a educação até a integração física, passando pela capacitação de recursos humanos, defesa e questões energéticas.
Temos muitos outros projetos em andamento.
Nosso governo ajudará a criar uma instituição semelhante à Embrapa, capaz de produzir soluções tecnológicas adequadas às condições e necessidades da agropecuária boliviana.
Quando, há poucas semanas, foram detectados focos de febre aftosa na Bolívia, a resposta brasileira foi rápida. O Brasil já doou 1 milhão de doses de vacina, e fará nova doação em março deste ano.
O gás é um fator decisivo de integração entre nossas economias. Queremos que continue a ser o carro-chefe de nossa associação energética.
Ontem, com muito diálogo, muita paciência e, sobretudo, com muita inteligência, demos um passo importante. Os componentes do gás que têm um valor de mercado reconhecido, passarão a ser remunerados pela sua cotação internacional.
Isso fará justiça ao valor do gás boliviano e atenderá o pleito do presidente Morales. Paralelamente, acordamos que o governo boliviano tomará as providências necessárias para que os novos contratos de operação entrem em vigor nos próximos dias.
O governo brasileiro também informou que tomará as medidas necessárias para permitir, até 15 de abril – Silas Rondeau que está me ouvindo possa ver um preço justo para o gás boliviano na termelétrica de Cuiabá.
Teremos a estabilidade e a segurança indispensáveis para entrar em uma nova etapa de nossa cooperação energética.
Ontem, o Presidente Morales e eu assistimos a uma apresentação sobre o pólo gás-químico na fronteira. Falamos sobre o interesse da Petrobrás em construir uma usina de biodiesel na Bolívia. Decidimos explorar, também, a possibilidade de construir uma hidrelétrica binacional no Rio Madeira.
Essas iniciativas significarão um salto qualitativo nas nossas relações e benefícios para ambos os países. Agregam valor, geram empregos e atraem investimentos.
Temos as condições para ir muito além do gás. Seremos parceiros na revolução da energia renovável, na petroquímica e na geração da hidroeletricidade. O Brasil apoiará o esforço da Bolívia para se industrializar e deixar de ficar dependente apenas de suas riquezas naturais.
Em nosso encontro, reafirmei ao presidente Evo o interesse brasileiro em incrementar e diversificar o comércio bilateral. O Brasil vai propor, no âmbito do Mercosul, a eliminação total das tarifas aos produtos bolivianos, abrindo o caminho para o ingresso da Bolívia como membro pleno do bloco do Mercosul.
Tomamos a decisão de eliminar todos os entraves para que o Brasil possa absorver as exportações bolivianas ameaçadas pelo corte das preferências comerciais hoje oferecidas pelos países desenvolvidos. Visamos, especialmente, têxteis e vestuário, setores que garantem empregos para muitos bolivianos.
Vamos criar as condições financeiras para a exportação de tratores para a Bolívia, fundamentais para a modernização de sua agricultura. O Brasil participará também nos projetos de infra-estrutura viária no nosso país vizinho.
Conversamos sobre a situação dos brasileiros na Bolívia e sobre como assegurar sua plena integração à sociedade boliviana.
Para estimular esse processo, assumimos o compromisso de trabalharmos juntos para regularizar a situação de famílias brasileiras de pequenos produtores na Bolívia. Também vamos fortalecer a agricultura familiar nos Departamentos de Beni e Pando. Isso permitirá que os brasileiros continuem a contribuir com seu trabalho para a modernização em curso da agricultura na Bolívia.
Prosseguiremos, ao mesmo tempo, regularizando a situação dos imigrantes bolivianos no Brasil, de forma a lhes garantir condições de trabalho decente.
Bolivianos no Brasil e brasileiros na Bolívia são, de certa forma, a ponta de lança da integração que queremos: uma América do Sul unida e solidária, que tem no bem-estar de seus cidadãos seu objetivo maior.
Aqui, como lá, os imigrantes merecem nosso reconhecimento, nossa consideração e nosso respeito.
O Brasil vê com grande satisfação a Presidência Pro Tempore da Bolívia na Comunidade Sul-Americana de Nações.
A liderança boliviana faz avançar os trabalhos da Comissão de Altos Funcionários, encarregada de lançar os alicerces da nossa CASA comum.
O Brasil também recebeu com entusiasmo o pedido da Bolívia de tornar-se membro pleno do Mercosul.
Ao lado de nossos irmãos argentinos, paraguaios, uruguaios e venezuelanos, trabalharemos com afinco nos próximos meses para que a incorporação boliviana se dê o mais rápido possível.
Agradeci o apoio boliviano à aspiração do Brasil de ocupar assento permanente em um Conselho de Segurança reformado, mais democrático e representativo.
Continuaremos a trabalhar juntos, no âmbito do G-20, em favor da liberalização do comércio internacional de produtos agrícolas. Somente unindo nossos esforços lograremos avanços reais para os países pobres e em desenvolvimento na Rodada de Doha.
A presença do presidente Evo demonstra que Bolívia e Brasil estão determinados a levar adiante os projetos e sonhos comuns que nos unem.
Tivemos mais uma ocasião para reafirmar a nossa disposição de transformar desafios em oportunidades para intensificar ainda mais a integração política, econômica, social e cultural entre os nossos países e populações.
Estou certo de que o presidente Morales, como eu, estará empenhado em tornar nosso projeto realidade.
Meu querido amigo Evo Morales, Companheiros da Bolívia, Companheiros brasileiros,
Eu penso que nós não deveríamos terminar essa reunião – e depois terá entrevista dos ministros de Minas e Energia da Bolívia e do Brasil – compreendendo esta reunião apenas como assinatura de protocolos ou de acordos. Seria muito pouco diante daquilo que pretendemos estabelecer enquanto parceria estratégica com a Bolívia e com os países da América do Sul e da América Latina.
O nosso propósito de estabelecer essa parceria estratégica tem uma mudança importante no comportamento do Brasil em relação aos seus parceiros da América do Sul e, certamente, tem uma mudança também dos nossos parceiros da América do Sul com relação ao Brasil. Não somos os imperialistas que alguns dizem que somos, não somos hegemonistas como alguns querem que sejamos mas, sim, somos um país que tem a compreensão de que, pela sua dimensão, geográfica, pela sua importância econômica, pelo seu desenvolvimento científico e tecnológico, não tem que disputar espaço com nenhum país irmão. Temos sim que prestar solidariedade, estabelecer parceria e compreender que são os países mais fortes economicamente, mais desenvolvidos do ponto de vista científico e tecnológico, mais desenvolvidos do ponto de vista industrial, que têm que ter a generosidade de compreender que os acordos bilaterais ou os acordos do bloco do Mercosul sempre têm que levar em conta as necessidades das economias menores, para que possamos viver num continente de paz, onde reina a democracia e onde o povo possa, definitivamente, conquistar sua cidadania.
Ontem apresentamos ao presidente Evo e aos seus ministros, um projeto que eu considero extraordinário para o desenvolvimento da Bolívia e do Brasil, em parceria certamente da parte brasileira da Petrobras e da Braskem, e em parceria com a Bolívia, com um pólo gás químico construído na fronteira dos dois países para gerar riquezas, para melhor explorar o potencial do gás da Bolívia e fazer com que o gás não seja apenas um produto de exportação, mas um produto de geração de emprego e renda para o trabalhador boliviano e o trabalhador brasileiro.
A Petrobras está discutindo e já mandou técnicos à Bolívia, na perspectiva de construção de uma usina de biodiesel. E aí, companheiro Evo, eu queria lhe dizer que a experiência que estamos tendo no Brasil é que o Programa do Biodiesel pode significar uma possibilidade extraordinária de gerar empregos para a gente do campo na Bolívia. Eu espero que um dia possa visitar o Brasil e eu te levar em algumas usinas que estão produzindo biodiesel de várias oleaginosas, para que você pense com seus técnicos qual a melhor para produzir na Bolívia.
Esteja certo que o mundo, nos próximos 15 ou 20 anos, se curvará aos bioscombustíveis; esteja certo que o mundo desenvolvido vai precisar muito mais dos países do Terceiro Mundo, como eles costumam chamar, dos países da América Latina, dos países da África, do que já precisaram. Houve o tempo da exploração do diamante, do cobre, do ouro, houve o tempo de muitas outras explorações das grandes potências em relação aos países mais pobres.
O biocombustivel é a possibilidade dos países mais pobres conquistarem a sua soberania econômica, porque não é preciso ajuda de governo de países ricos. O que nós queremos são projetos e financiamentos para que o povo pobre da América Latina possa trabalhar e, com o resultado do seu trabalho, pagar a dívida que nós contraímos para desenvolver os nossos países.
Quero que saiba, companheiro Evo, que estou mais quatro anos na Presidência do Brasil, com a total disposição de fazer com que o nosso relacionamento nesses quatro anos possa avançar mais do que avançou em décadas, porque os nossos governantes viviam de costas uns para os outros, nos vendo como inimigos, ao invés de se verem como parceiros.
Reconheço de público a justeza de todos os pleitos bolivianos para melhorar a condição de vida do seu povo. Nem sempre poderei atender todas as demandas, mas saiba, companheiro Evo, que toda vez que me encontro contigo, eu não esqueço que somos chefes de Estado de países soberanos, que precisamos agir como chefes de Estado, cada um em defesa do seu país, mas antes de ser presidente da República, você na Bolívia e eu aqui no Brasil, nós éramos companheiros do movimento sindical e não podemos permitir que essa nossa primeira relação seja diminuída porque hoje somos presidentes, porque nós estamos presidentes, o que nós somos mesmo é trabalhadores e quando terminar o nosso mandato poderemos nos encontrar, em qualquer parte do mundo, e dizer que governamos pensando nos mais pobres, em fazer justiça social, e poderemos nos encontrar de cabeça tranqüila, muitas vezes sabendo que não fizemos tudo que queríamos fazer, mas que fizemos tudo que foi possível fazer.
Eu te desejo toda sorte do mundo e que possas concretizar na Bolívia grande parte dos sonhos que carregastes durante toda a tua vida antes de chegar à Presidência da República.
Meus parabéns e muita sorte à Bolívia e ao Brasil.