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Anemia Falciforme é tema de 2° fase de projeto com Angola
A área de saúde está entre as mais importantes da cooperação técnica entre Brasil e Angola. Em visita recente do Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ao país africano, mais dois projetos foram assinados no tema . Um deles, "Apoio à Implementação e Gestão de Medidas para Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme em Angola" , já vai em sua 2ª fase, sob coordenação da Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e implementação técnica do Ministério da Saúde (MS) do Brasil, em parceria com o governo de Angola.
A iniciativa tem como objetivo apoiar a elaboração da Política e do Programa Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme em Angola. Para tanto, promoverá capacitações dos profissionais de saúde de Angola, nos seguintes temas: atenção básica focada no auto cuidado; qualificação e ampliação da triagem neonatal; atendimento integral de qualidade às pessoas com doença falciforme; e sensibilização quanto à doação voluntária de sangue em Angola.
O projeto contemplará também formação do corpo técnico que trabalha em um laboratório de referência no país, localizado no Hospital Pediátrico David Bernardino, onde são realizados os testes da doença, inclusive os de triagem neonatal, através do “teste do pezinho”. A iniciativa será complementar a um importante trabalho já desenvolvido por instituições norte-americanas, que têm capacitado os profissionais de saúde do laboratório para realização da triagem neonatal (cerca de 7 mil testes por mês) e o eventual encaminhamento dos casos positivos para tratamento adequado.
Para o Diretor do Hospital, Francisco Domingos, que acompanha a parceria com o Brasil desde a 1ª fase do projeto, “o Brasil é país que já tem muita experiência no atendimento integrado ao doente de células falciforme. Trata-se de um atendimento multidisciplinar, no qual queremos nos inspirar” . No Hospital Pediátrico David Bernardino, 4 médicos e 5 enfermeiros atendem cerca de 90 doentes de anemia falciforme por dia, entre novos casos, tratamento contínuo e urgências, no caso de crises variadas como dores fortes no corpo, pneumonia e anemia severa.
Brígida Santos, 49 anos, pediatra com diferenciação em hematologia, é a responsável pelo Centro de Apoio ao Doente Anêmico do Hospital. Uma das maiores autoridades angolanas na doença, participou da 1ª fase do projeto, tendo passado um mês no Rio de Janeiro para a realização de visitas técnicas, acompanhamento de alguns casos especiais e, especialmente, dos protocolos de atendimento praticados no País.
A pediatra relata estar bastante motivada com a nova fase da iniciativa e acredita que, com as capacitações recebidas, será possível criar um Programa de Atenção Integrada para doentes de anemia falciforme, em âmbito nacional, de modo a ampliar os locais de atendimento em Angola que contam com pro-fissionais de saúde especializados na doença, evitando assim que os doentes de outras regiões do país tenham que se deslocar até Luanda. “Quando se recebe tratamento adequado, prolonga-se a esperança de vida, e é isso que queremos fazer” , sublinhou Santos.
Antonio Pereira, de 14 anos, foi diagnosticado com a doença quando criança. Com fortes dores no corpo, teve que ir ao Hospital para receber medicação de urgência. Por causa da anemia falciforme, o adolescente já não pode mais jogar bola, o que adorava fazer; mas sai aliviado do hospital, já sem dores, após ser devidamente medicado pela enfermeira Antonia Muabi, de 55 anos, uma das que participou de capacitações no Brasil em 2011, durante a 1ª fase do projeto. Ela visitou um centro de tratamento da doença em Salvador e assistiu a um transplante de medula, uma das práticas utilizadas para minimizar os sintomas da anemia falciforme. “Aprendi a fazer curativos para úlceras muito mais eficientes, que ajudaram muito os meus pacientes aqui” , comentou Muabi.
O que é anemia falciforme?
A anemia falciforme é a doença hereditária mais comum em todo o mundo, com alto índice de adoe-cimento e morte. Ela é causada por uma mutação no gene da hemoglobina e causa obstrução de vasos sanguíneos, episódios de dor, lesão de órgãos e anemia crônica. Embora ainda seja incurável, muitas das suas manifestações e complicações são passíveis de tratamento e de prevenção, garantindo sobrevivência e melhor qualidade de vida aos doentes. O seu diagnóstico se dá por um exame especial de sangue.
Na medida em que a taxa de mortalidade entre as crianças não cuidadas é de cerca de 80%, até os 5 anos de idade, e Angola registra mais de 1.000 novos casos de anemia falciforme por ano, além de contar com 20% da sua população portadora da doença, a cooperação nesse tema tem a função de literalmente salvar vidas. Com os cuidados adequados, esse número diminui drasticamente. A vida média das pessoas não cuidadas é de 08 anos enquanto que pessoas cuidadas podem alcançar a terceira idade. A taxa de mortalidade materna em mães não cuidadas é de 50% reduzida para 2% em gestantes cuidadas. Dessa forma, o diagnóstico prévio e o tratamento adequado permitem serem alcançados bons resultados.
No Brasil, dados do Programa Nacional de Triagem Neonatal mostram que nascem 1 a cada 1.000 crianças com doença falciforme, sendo a Bahia o estado com maior incidência. Desde 2005, o País possui a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme. São aproximadamente 15 anos de legislação específica da doença, além de décadas de experiência, que possibilitam ao Brasil compartilhar suas boas práticas com Angola.
1° fase do projeto
Por ocasião do I Congresso Angolano de Hematologia, em 2008, o governo de Angola solicitou cooperação ao governo do Brasil na área de doença falciforme. A primeira fase do projeto foi realizada entre 2010 e 2016 e incluiu atividades de capacitação de médicas, enfermeiras, dentistas e técnicas de laboratório do Hospital Pediátrico David Bernardino, no Brasil, de modo que pudessem conhecer as práticas e estratégias brasileiras, desde o atendimento, diagnóstico laboratorial e por imagem, recuperação de lesões ósseas, triagem neonatal, tratamento básico, entre outros. Alguns profissionais angolanos fizeram, ainda, um estágio no Centro de Referência do Instituto de Pediatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para conclusão do projeto, um Seminário técnico foi organizado em Angola, com a ida de especialistas brasileiras a Luanda.
Autor: Janaina Plessmann